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ROMEU E JULIETA __ PARTE 4

Estrutura dramática

Em Romeu e Julieta, Shakespeare emprega diversas técnicas dramáticas que têm adquirido bastante elogio de críticos. A técnica mais notavelmente destacada são as bruscas mudanças de gênero da comédia para a tragédia (como, por exemplo, o intercâmbio de paranomásia entre Romeu e Mercúcio pouco antes da entrada de Tebaldo). Antes da morte de Mercúcio no Ato III, a peça é basicamente uma comédia, mas após sua morte, a obra adquire subitamente um tom sério e assume elementos trágicos.

Quando Romeu é punido pelo Príncipe e se exila, o fato do protagonista não ter sido executado e o de que Frei Lourenço oferece um plano para reunir ambos, o público/leitor ainda pode esperar que os amantes acabarão bem. Nessa etapa, o público/leitor se encontra em um "estado ofegante de suspense" até a abertura da última cena no túmulo, afinal, se Romeu está atrasado o suficiente para o Frei aparecer, ele e Julieta ainda poderão se salvar. Essas mudanças repentinas de estados (de esperança para desespero, e depois indulto, e novamente esperança) são simplesmente elementos que servem para salientar a tragédia, até que a esperança final termina e os protagonistas morrem.

Shakespeare também utiliza sub-enredos para oferecer uma visão mais clara das ações dos personagens principais: quando a peça abre, Romeu está apaixonado por Rosalina, que tem recusado toda a corte do moço. Esse afeto que Romeu nutre por Rosalina é um evidente contraste entre seu amor por Julieta mais tarde. Esse contraste permite uma comparação entre ambos os relacionamentos através do qual o público (ou leitor) tem a chance de acreditar na seriedade do amor e do casamento entre Romeu e Julieta. O afeto de Páris por Julieta também estabelece, por sua vez, um contraste entre os sentimentos da moça por ele e seus sentimentos por Romeu. A linguagem formal que ela utiliza quando está na presença de Páris, bem como a forma como ela fala sobre ele para sua Ama, mostram que seus sentimentos mentem com Romeu. Além disso, o sub-enredo das rixas entre os Montecchios e os Capuletos providencia uma atmosfera de ódio que se torna o principal contribuinte, segundo alguns críticos, para o final trágico da peça.

Linguagem


As formas poéticas utilizadas por Shakespeare ao longo da obra são muito variadas, o que torna Romeu e Julieta rica em poesia (apesar das traduções para o português terem insistido na prosa). Ele inicia com um prólogo de 14 linhas em forma do soneto shakespeariano, recitado por um Coro. A maior parte do texto de Romeu e Julieta é, contudo, escrita em versos brancos, muitos deles dentro do pentâmetro iâmbico, com menor variação rítmica do que a maioria de suas peças posteriores. Shakespeare escolhe suas formas poéticas de acordo com o personagem que irá falar. Frei Lourenço, por exemplo, utiliza as formas do sermão e da síntese, e a Ama usa unicamente o verso branco correspondendo rigorosamente à fala coloquial. Cada uma dessas formas também é moldada à emoção da cena em que o personagem ocupa. Romeu, por exemplo, no início da peça tenta usar o soneto de Petrarca para falar de Rosalina - provavelmente porque essa forma era frequentemente utilizada pelos homens que possuíam o intuito de elogiar a beleza das mulheres cujo amor era impossível de atingir pela falta de reciprocidade, como na situação dele com Rosalina. Essa forma de soneto também é usada pela Senhora Capuleto quando ela tenta convencer sua filha do homem maravilhoso que o Conde Páris é.

Quando ocorre o encontro entre Romeu e Julieta, a forma poética muda: do soneto petrarquiano (que estava se tornando arcaico na época de Shakespeare), temos uma forma mais contemporânea de soneto, usando metáforas como "peregrino" e "santos". Finalmente, quando os dois se encontram no terraço, Romeu tenta usar a forma de soneto que sensibilize seu amor, mas Julieta rompe a técnica ao dizer: "Acaso ainda me amas?" Ao fazer isso, ela busca uma expressão verdadeira e sincera, ao invés de uma exageração poética do amor de ambos. Nas falas de Julieta, Shakespeare usa palavras com monossílabos quando ela está diante de Romeu, e linguagem formal quando diante de Páris.

Outras formas poéticas usadas na peça são o epitalâmio (em Julieta); a rapsódia (no diálogo que Mercúcio cita uma tal de Rainha Mab), e a elegia (em Páris). Na linguagem da peça, Shakespeare economiza seu estilo prosaico, utilizando-o com mais frequência nas falas das personagens mais pobres, embora ele as use também em outras, como em Mercúcio. O humor, por sua vez, é um elemento importante na obra: o estudioso Molly Mahood identificou, pelo menos, 175 trocadilhos no texto. Muitos desses trocadilhos são piadas de natureza sexual, especialmente as que envolvem Mercúcio e a Ama.

Psicanálise

Os primeiros críticos psicanalíticos da peça viram um grande problema no enredo de Romeu e Julieta: a personalidade impulsiva de Romeu, decorrente de uma suposta "agressão mal-controlada e dissimulada", que levou Mercúcio para a morte e também o suicídio dos amantes. Romeu e Julieta não é considerada como uma peça psicologicamente complexa, e sua leitura psicanalítica se atenta a trágica experiência masculina com a doença. Norman Holland, escrevendo em 1966, considerou o "sonho de Romeu" como um "desejo realista que satisfaça a fantasia de ambos em termos do mundo adulto de Romeu e suas hipotéticas fase oral, fálica e edípica na infância, tão frequentes no desenvolvimento psicossexual". Hollanda aproveita e reconhece que um personagem dramático não é um ser humano com os processos mentais separados dos do autor. Críticos como Julia Kristeva focam-se no ódio entre as duas famílias, argumentando que esse ódio é a causa da paixão de Romeu e Julieta, e salienta que essa sua compreensão se manifesta de forma muito clara na linguagem dos dois: Julieta, por exemplo, diz "o meu único amor nasceu do meu único ódio" e, muitas vezes, expressa sua paixão através da antecipação da morte de Romeu. Essas interpretações conduzem a uma especulação quanto à psicologia do dramaturgo, em particular pelo luto que, dizem os psicanalistas, Shakespeare foi obrigado a assumir diante da morte de seu filho Hamnet.

Feminismo

A crítica feminista argumenta que a culpa da briga entre as famílias de Verona reside no sistema de sua sociedade patriarcal. Para Coppélia Kahn, por exemplo, o código de violência restritamente masculino imposto a Romeu é a principal força-matriz de sua tragédia; quando Teobaldo mata Mercúcio, Romeu torna-se violento, lamentando que Julieta tenha o feito "afeminado". Nesta perspectiva, os jovens do sexo masculino "tornam-se homens" por intermédio da violência em nome de seus pais ou, no caso dos funcionários ou serviçais, de seus patrões ou mestres. Na peça, a rivalidade também está ligada à virilidade masculina, como demonstram suas inúmeras piadas sobre a "cabeça das solteiras". Julieta também delega um código de docilidade feminina, permitindo que outros, como o Frei, resolvam seus problemas por ela. Outros críticos, como Dympna Callaghan, vê o feminismo na peça sob um ângulo histórico, sublinhando que quando a peça foi escrita e encenada, a ordem feudal era contestada pelo governo inglês, que estava cada vez mais centralizado e influenciado pelo capitalismo; ao mesmo tempo, as novas ideias puritanas acerca do casamento estavam menos preocupadas com os males da "sexualidade feminina" do que as das épocas anteriores, e mais simpáticas em relação às peças que tratavam do tema do amor: assim, quando Julieta evita a tentativa de seu pai de obrigá-la a se casar com um homem pelo qual ela não nutre sentimento algum, ela estaria desafiando esta ordem patriarcal de uma forma que não teria sido possível em um momento anterior da história.

 
 
 

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