ROMEU E JULIETA __ PARTE2
- wanderleyramos27
- 15 de fev. de 2021
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Fontes textuais
Romeu e Julieta pertence a uma tradição de romances trágicos que remontam a antiguidade. Um desses romances é o da história de Píramo e Tisbe, da Metamorfoses de Ovídio, cujo enredo contém paralelos com a história de Shakespeare: os pais dos dois amantes detestam-se mutuamente, e Píramo acaba acreditando que Tisbe está morta. Tradutores contemporâneos deste poema narrativo muitas vezes referem-se ao enredo de Píramo e Tisbe como "o Romeu e Julieta da antiguidade". Os Contos Efésios de Xenofonte de Efésios, escrito em meados do século III, também possui muitos elementos semelhantes ao da peça, incluindo a separação drástica dos protagonistas, e o frasco cuja bebida induz a um estado de morte aparente.
A versão mais recente conhecida do conto de Romeu e Julieta é a história de Mariotto e Gianozza por Masuccio Salernitano, no conto 33 de seu Il Novellino, publicado em 1476. Salernitano ambienta sua história em Siena e implanta algumas locações de sua própria vida nos eventos da história. A sua versão inclui elementos como o casamento secreto, o conluio do Frade, a briga que decorre do assassinato de um cidadão, o exílio de Mariotto, o casamento forçado de Gianozza, o frasco, e a mensagem crucial no final. Nesta versão, Mariotto é capturado e decapitado, enquanto Gianozza morre de tristeza.
Luigi da Porto adaptou essa história como Giulietta e Romeo e a incluiu em sua Historia novellamente ritrovata di due Nobili Amanti publicada em 1530, juntando o conto de Píramo e Tisbe com o Decamerão de Giovanni Boccaccio. Da Porto contribuiu muito para a concepção moderna, pois além de elaborar o nome dos amantes e de suas famílias rivais como Montecchi e Capuleti, colocou a localização da peça em Verona. Ele também criou personagens que hoje correspondem ao Mercucio, ao Tebaldo e ao Páris de Shakespeare. Da Porto apresenta o seu conto como historicamente verdadeiro e alega que ele se passou na época de Bartolomeo II della Scala (um século antes de Salernitano).
Os Montecchios e os Capuletos eram facções políticas do século XIII (de 1201 à 1300), mas a única ligação dissidente que ocorreu entre eles é a mencionada no Purgatório de Dante. Na versão de da Porto, Romeu toma o veneno e Giulietta se fere com o punhal do amado.
Em 1554, Matteo Bandello publicou o segundo volume de seu Novelle incluindo a sua própria versão de Giulietta e Romeo. Bandello enfatiza a inicial tristeza de Romeu no início da peça e a contenda entre as famílias, além de introduzir na obra Benvólio e a Ama. O enredo produzido por Bandello foi traduzido para a língua francesa por Pierre Boaistuau em 1559 (século XVI),no primeiro volume de sua Histories Tragiques. Boaistuau adicionou moralidade e sentimento, e também um tanto de linguagem retórica nos diálogos das personagens da obra.
Como havia uma tendência entre os poetas e dramaturgos em publicar trabalhos baseados nas famosas novelles italianas — os contos da Itália figuravam entre os mais populares do teatro da época - Shakespeare tomou vantagem dessa popularidade nas seguintes obras (todas derivadas de novelles italianas): O Mercador de Veneza, Muito Barulho Por Nada, Tudo Bem Quando Termina Bem, Medida por Medida, e Romeu e Julieta. O bardo inglês pode ter sido muito bem familiarizado com a coleção de contos de 1567 elaborada por William Painter, intitulado Palácio do Prazer, que inclui uma versão em prosa da história de Romeu e Julieta nomeada "The goodly History of the true and constant love of Rhomeo and Julietta". Antes dessas produções, contudo, em 1562 era publicado o poema narrativo A Trágica História de Romeu e Julieta de Arthur Brooke que, embora tivesse elementos intencionalmente ajustados para refletir alguns trechos do enredo de Tróilo e Créssida de Chaucer, é considerado uma tradução fiel da versão de Boaistuau.
Acredita-se que Romeu e Julieta seja uma dramatização desta tradução de Brooke, e que Shakespeare segue o texto fielmente, acrescentando-lhe, contudo, maiores destaques para a maioria dos personagens secundários, especialmente a Ama e Mercúcio. Dido, rainha de Cartago e Herói e Líder — ambos os poemas escritos na época de Shakespeare pelo seu contemporâneo Christopher Marlowe — talvez tenham sido influências diretas para a história de Romeu e Julieta, mesmo que o final de ambos tenha a atmosfera na qual as trágicas histórias de amor pudessem prosperar, ao contrário do final trágico da peça.
Data e texto
Os estudiosos não sabem exatamente quando Shakespeare escreveu Romeu e Julieta. No entanto, podemos adquirir determinadas pistas: a Ama de Julieta refere-se a um terremoto que tinha ocorrido 11 anos antes. Considerando que surgiu um terremoto na Inglaterra em 1580, é possível determinar que a peça se passa em 1591 ou que esse é o ano em que Shakespeare escreveu a obra, embora muitos outros terremotos, tanto na Inglaterra quanto em Verona tenham ocorrido antes ou depois, fazendo com que diferentes datas sejam propostas. Considerando também que os estudiosos apontam semelhanças do estilo artístico usado em Romeu e Julieta a Sonhos de Uma Noite de Verão e outras peças convencionalmente datadas em 1594-95, a tradição diz que Romeu e Julieta foi composta entre 1591 e 1595. Existe a hipótese de que a peça era ainda um projeto recentemente iniciado no ano de 1591, concluído por Shakespeare em 1595.
O Romeu e Julieta de Shakespeare foi publicado em duas edições de quarto antes da publicação do First Folio em 1623. As duas versões são referidas como Q1 e Q2, respectivamente. A primeira edição impressa, Q1, aparece no início de 1597, realizada por John Danter. Como seu texto contém muitas diferenças se comparada às últimas edições, ela é conhecida como um 'mau quarto'. O editor T.J.B. Spencer explicou, no século XX, que a versão "tem um texto detestável, provavelmente uma reconstrução da peça a partir de memórias imperfeitas de um ou mais ator(es)", sugerindo que ela foi pirateada para publicação. Uma possível explicação para essas deficiências da Q1 é que a peça (como muitas outras de seu tempo) pode ter sido editada antes da atuação da companhia de teatro. Em qualquer caso, seu aparecimento no início de 1597 torna o ano de 1596 como a data mais tardia para a composição da obra.
A segunda edição, Q2, é chamada de A Excelentíssima e Lamentável Tragédia de Romeu e Julieta e representa um texto superior ao da versão anterior (Q1). Impressa em 1599 por Thomas Creede e publicada por Cuthbert Burby, ela possui cerca de 800 linhas a mais do que a Q1. A sua capa descreve-a como "recém-corrigida, aumentada e alterada". Com base nessa informação, acredita-se que a Q2 foi baseada no projeto pré-encenação de Shakespeare (conhecido como seu "foul papers"), uma vez que existem curiosidades textuais como as diversas rubricas para personagens e "falsos inícios" para discursos que foram presumivelmente arrancados pelo autor mas erroneamente preservados pelo editor. Seu texto é mais completo e fiável, e por isso foi reimpresso em 1609 (Q3), 1622 (Q4) e 1637 (Q5). Com efeito, todos os últimos quartos e fólios de Romeu e Julieta são baseados em Q2, como todas as edições modernas e seus editores acreditam que qualquer defeito que haja em edições anteriores ao Q2 (boas ou más) foram causadas pelos seus respectivos impressores e/ou pelas gráficas e editoras da época, e não por William Shakespeare.
O texto do Primeiro Fólio, de 1623, é baseado primariamente em Q3, com esclarecimentos e correções feitos a partir de um livro teatral ou a partir do Q1. Outras edições da peça em Fólio foram impressas em 1632 (F2), 1664 (F3), e em 1685 (F4). As versões modernas - contando com os vários fólios e quartos - apareceram pela primeira vez na edição de 1709 do dramaturgo Nicholas Rowe, seguido pela versão de Alexander Pope em 1723. Essa última versão merece especial destaque, porque Pope iniciou uma tradição editiva da peça ao adicionar algumas etapas de posições de palco e cena, já que Q2 carecia dessas direções, presentes, contudo, em Q1. A tradição continuou a ser usada no período do Romantismo. As edições com maior número de notas apareceram pela primeira vez na Era vitoriana e continuam a ser produzidas nos dias de hoje, onde existem uma ampla variedade de notas ao longo do texto, destacando e explicando as origens e a cultura por detrás da peça.
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